Texto e fotos por Caio Rechuem Lopes Martinez
Guardo em minha memória aquilo que me fez sentir o que hoje é constante. A fim de construir uma narrativa sobre o começo de tudo isto — algo que considero ser de extrema relevância para estancar esta hemorragia nacional —, recorrerei a um trabalho produzido durante minha graduação e que por vezes orbita minhas reflexões teóricas. Portanto, tentarei através de uma breve reorganização, ressignificar esta experiência que me atravessou tão fortemente.
Em 14 de março de 2018, a alguns dias da entrega desta tarefa que ainda se encontrava por fazer. Recebo a sufocante notícia de que Marielle Franco, então vereadora da cidade do Rio de Janeiro, é assassinada a tiros junto com seu motorista no bairro do Estácio. Como consequência, diversos protestos passam a ocorrer em todo o país, e apesar de me encontrar imerso em um sentimento de completa impotência, participo daquele com a concentração marcada para os arredores da Assembleia legislativa.
Já no dia seguinte, à procura de algo que pudesse me auxiliar — tanto academicamente quanto emocionalmente —, retorno ao centro com o intuito de refazer o percurso da manifestação. Levando em consideração que tais ruas — embora eu ainda ache pouco — são usualmente percorridas com este propósito, passo a procurar por vestígios destas inúmeras convulsões sociais, sejam eles marcações e cartazes sobre os edifícios, visadas constituídas por estranhas coincidências ou até a indiferença do cotidiano urbano perante os mesmos.
Após pouco mais de 3 anos, tivemos somente a prisão dos executores, acompanhada da informação de que fariam parte de um grupo de milicianos que conta com estreita relação junto a determinada família política. Deixando ainda em aberto, a identidade dos mandantes e suas reais motivações.
Entretanto, também temos uma estranha coincidência, baseada em uma anotação na planilha de acesso ao condomínio Vivendas da Barra. O registro refere-se a uma das constantes visitas do ex-policial militar, acusado de ser o motorista da emboscada, ao condomínio onde até então residia o acusado de ser o atirador — ambos indicados pela polícia e pelo Ministério Público do Rio de Janeiro —. Justamente nesta visita em específico, ocorrida no mesmo dia do crime, a entrada do veículo não foi autorizada pela casa daquele que mais tarde dispararia os tiros. Mas sim a poucos metros de seu domicílio, por alguém na casa de número 58, localizada na mesma rua.
Fato é, que enquanto revisito este trabalho, estamos às vésperas de mais uma série de manifestações populares pelo impeachment do dono da casa 58 deste condomínio de luxo, próximo ao posto 4 da praia da Barra da Tijuca. Sendo assim, me parece oportuno reapresentar alguns dos registros produzidos na época, e desta vez, em conjunto do ato de marca-los cartograficamente sobre as ruas desta cidade.
Sobre o autor:
Caio Rechuem Lopes Martinez graduou-se em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Santa Úrsula (2020). Sua monografia foi agraciada com o 37º Prêmio Arquiteto do Amanhã e o 5º Prêmio Grandjean de Montigny, ambos concedidos por CAU-RJ e IAB-RJ.